Da minha sacada enxergo um boteco. Nele está um casal: ela era palmiteira, reparei.O leitor que não conheça a expressão palmitagem, deve estar se perguntando: o que é isso? Antes que você fuja pro Google, deixe que eu te explique: palmitagem é como são chamadas relações amorosas entre uma pessoa negra e uma branca. Algumas pessoas chamam a pessoa negra de palmiteira, como a moça que nós estamos observando com o seu namorado.
Vamos voltar para a cena onde o tom das vozes subiram ainda mais enquanto a gente fazia esse parêntese. O palmito oscilava entre branco transparente e o vermelhão que ia se acentuando conforme sua indignação com a discussão acalorada.
– Branquinho! Me chamou de branquinho, esse preto abusado!
– Calma, meu palmitinho, eu te chamo assim e você não reclama! Por que se incomodou com isso agora?
– É diferente, pretinha! Você me chama carinhosamente de seu palmitinho. Agora aquele negão me chamando de branquinho foi pra me ofender! Me diminuir!
O palmitinho não se conformava e eu quase botei pipocas pra fazer no microondas e assistir. Não o fiz, porque poderia perder algum trecho importante. Prioridades!
– Agora você vê! Me discriminar por causa da cor da minha pele! A audácia daquele criolo! Isso é o tal do racismo reverso, pretinha! Acabei de sofrer racismo reverso! Vocês negros as vezes é que são os mais racistas!!!
– Ô, meu palmitinho, já te expliquei que não existe isso de racismo reverso…Haja amor…e haja paciência…
– Como que não existe? Se ele me chamou de branquinho? Racismo reverso, sim, senhora!!!
– Racismo reverso, é?
Com um sorriso que não sei dizer se era de condescendência ou de quem se segurava por explicar como quem explica a uma criança, a namorada começou a metralhar:
– Tá. Te chamou de branquinho. E?
– Como assim: E???
– Sim, repito, e o que te acontece por ser visto como um branquinho? Você deixa de ser selecionado para cargos de liderança, melhor remunerados? Você passa a ser seguido em supermercados e lojas? Você passa a ser confundido com bandido se estiver correndo na rua? Você passa a ser confundido com segurança se estiver de terno? Se você estiver numa área Vip alguém olha pra você e acha que você está lá para servir? Você passa a liderar o ranking de menores salários e maior número de encarceramento?
– Pára, pára, pára, nossa, quanto mimimi! Que exagero tudo isso! Vai me dizer que tudo isso acontece porque a pessoa é preta?
– Bom, então se nada acontece por ser preta, esse negócio de cor não interfere em nada, então…que mal tem te chamar de branquinho?
– É diferente. Ele quis me diminuir!
– Ah…e tudo que te listei antes de certo aumenta a imagem dessas pessoas, de certo!
– Mas eu não estou acostumado! Vocês estão!
– Entendi, no nosso lombo você acha que já estamos acostumados que batam. Trago novidades, não estamos acostumados e nem silenciamos. Se acostume com esse chamado. Branquinho é o primeiro dos muitos adjetivos que você vai ouvir. E pode ter certeza que não serão pra te aumentar!
Depois de receber essa militada marota, que você e eu vimos que ele pediu, o branquinho passou foi pra roxinho, roxinho raiva. Ficou mudo e emburrado o resto do tempo que assisti a cena.
Enquanto isso, a namorada suspirava fundo e soltava um muxoxo com uma expressão indignada.
Mulher preta é puro dengo, mas não azede o doce….Quem não pode com mandinga, não carrega patuá, já dizia minha avó.
Sou Cíntia Colares,
Sou Flor de Lótus
Você me anima. Vou tomar coragem e postar sim. Em breve. Beijos
Oi Cíntia, vendo seu texto publicado aqui e lembrando de sua fala sobre suas postagens frequentes começo a me animar para publicar coisas. Sou travado, cheio de medo, inseguranças.
Mas lá no curso gostaria de ter lhe dito também da pedagogia da encruzilhada do Luiz Rufino. E da oralitura de Leda Martins além das escrevivências de Conceição Evaristo. Gente que conversa com seu texto. Beijos